Priscas Eras
Uma história ilustrada da evolução da vida na América do Sul
- Peter Moon
- 06/06/2023
- 13:08
Ilustração: Maurílio Oliveira
Tubarões bizarros, amonoides e celacantos
Os mares do Permiano no Brasil eram povoados por peixes bizarros, amonoides e celacantos. Conheça alguns cujos fósseis foram achados no Nordeste
Na América do Sul, os fósseis das criaturas do período Permiano são encontrados principalmente em três locais: os Andes bolivianos; o Sul do Brasil nas rochas da formação Irati (cenário desta nossa paleoarte); e nas rochas da formação Pedra de Fogo, que rasga os estados do Piauí e Maranhão. O permiano marinho é melhor representado através dos fósseis maranhenses e bolivianos.
Entre 298 a 252 milhões de anos atrás, os mares do Permiano no Brasil eram habitados por criaturas pertencentes a praticamente todos os grupos marinhos nossos conhecidos. Já estavam presentes, por exemplo, os três grupos de peixes atuais: os peixes sem mandíbula (o caso das lampreias); os condrictios ou peixes cartilaginosos (tubarões, quimeras e arraias) e os osteíctios ou peixes ósseos.
Entre os peixes ósseos, já havia o grupo dos actinopterígeos, ou peixes de nadadeira raiada, que perfazem 96% das espécies viventes. Da mesma forma, no Permiano faziam-se presentes os sarcopterígeos, ou peixes nadadeiras lobadas (ósseas e carnudas), o caso dos celacantos e dos peixes-pulmonados como a nossa pirambóia (Lepidosiren paradoxa).
Todos estes grupos são para nós familiares. No Permiano, entretanto, seus “rostos” não eram nada familiares. Alguns chegavam mesmo a ser bizarros. Como estes tubarões:

Anisopleurodontis pricei
Assim como acontece com a imensa maioria dos peixes cartilaginosos, o tubarão Anisopleurodontis pricei é conhecido apenas por seus dentes (há mais de duas dezenas deles). Segundo o paleoictiólogo Rubens da Silva Santos (1918-1996), como alguns dentes encontram-se articulados, isso permite inferir que eles se encontravam dispostos na boca do peixe em duas fileiras longitudinais, lembrando um serrote.
Havia dois tipos de dentes: os anteriores, na frente da mandíbula, eram maiores e mais pontiagudos, adaptados para capturar presas, enquanto os dentes posteriores eram menores e mais adequados a triturar alimento duro, com moluscos amonites, por exemplo.
Estima-se que A. pricei era um animal de grande porte, com 4 a 5 metros de comprimento. O nome do gênero, Anisopleurodontis, quer dizer algo como “dentes laterais diferentes”. Já a espécie é uma homenagem ao paleontólogo Llewellyn Ivor Price (1905-1980), que foi quem coletou seus fósseis em 1948 na formação Pedra de Fogo, em Pastos Bons (MA). As rochas da formação Pedra de Fogo têm datação entre 279 e 272 milhões de anos.
Parahelicoprion mariosuarezi
Trata-se de um tubarão do mesmo grupo do Anisopleurodontis, porém com uma dentição ainda mais bizarra. Seu nome quer dizer “serra quase espiral”, devido à disposição dos dentes, que se projetam para fora da boca num arranjo curvo de lâminas cortantes.
Os fósseis do Parahelicoprion indicam um animal gigantesco, que podia atingir até 12 metros de comprimento. Era um dos predadores de topo dos mares permianos. Seus fósseis foram achados na formação Copacabana, na Bolívia, com datação entre 298 e 295 milhões de anos.
Taquaralodus albuquerquei
Os xenacantos eram uma família extinta de tubarões-de-água-doce, mas que possivelmente também habitavam as águas salobras dos estuários marinhos. Eram peixes de tamanho médio, de um e dois metros de comprimento. Tinham corpo fino e alongado, como Taquaralodus albuquerquei, cujos dentes são provenientes dos mesmos sedimentos de onde saíram os dentes do Anisopleurodontis, na formação Pedra de Fogo, em Pastos Bons (MA). Fósseis de Taquaralodus também foram encontrados na formação Irati, no Sul do Brasil.
AMONOIDES
Os amonoides ou amonitas eram moluscos cefalópodes, o mesmo grupo dos polvos e das lulas. Diferentemente destes último, os amonoides ainda conservavam suas conchas, que eram espiraladas, muito semelhantes aos náutilos modernos.
Os amonoides surgiram no período devoniano, há 409 milhões de anos, e experimentaram uma grande diversificação durante o Permiano. Havia animais de todos os tamanhos, desde aqueles que caberiam na palma da mão, até verdadeiros monstros com diâmetro de 3,5 metros (como foi o caso, muito mais tarde, de Parapuzosia seppenradensis, no Cretáceo). Os amonoides dominaram os mares por 330 milhões de anos, até desaparecerem juntamente com os dinossauros, há 66 milhões de anos.
Os fósseis de celacanto mais antigos são do período Devoniano, com 410 milhões de anos. Acreditava-se que os celacantos teriam se extinguido no final do Cretáceo, há 66 milhões de anos. Mas, em 1938, um exemplar foi pescado na costa da África do Sul. Hoje são conhecidas duas espécies: o celacanto do Oceano Índico (Latimeria chalumnae), encontrado na costa da África do Sul e nas Ilhas Comoro, e o celacanto indonésio (Latimeria menadoensis). Na formação Pedra de Fogo foram achadas escamas de celacanto.
Itapyrodus punctatus
O peixe com jeitão de linguado é o Itapyrodus punctatus, membro de outro grupo extinto, os Petalodontiformes. Estes peixes evoluíram há 350 milhões de anos, ainda no período Carbonífero, e desapareceram há 252 milhões de anos, na maior extinção em massa da história da vida na Terra, aquela que encerrou o Permiano. Fósseis de Itapyrodus também foi achados na formação Irati, no Sul do Brasil.
MAURÍLIO OLIVEIRA é um artista plástico carioca especializado na reconstrução de organismos e ambientes extintos. Desde 1999, atua no setor de paleontologia de vertebrados do Museu Nacional, no Rio de Janeiro.